CANTIGA I
Esta é a primeira cantiga de loor de Santa Maria, ementando os vii goyos que ouve de seu filho.
Des hoge mais quer’ eu trobar
pola Senhor honrada,
em que Deus quis carne filhar
bẽeita e sagrada,
por nos dar gran soldada
no seu reino e nos herdar
por seus de sa masnada
de vida perlongada,
sem havermos pois a passar
per mort’ outra vegada.
E porém quero começar
como foi saudada
de Gabriel, u lhe chamar
foi: «Benaventurada
Virgem, de Deus amada:
do que o mund’ há de salvar
ficas ora prenhada;
e demais ta cunhada
Elisabét, que foi dultar,
é end’ envergonhada».
E demais quero-lh’ enmentar
como chegou cansada
a Beleem e foi pousar
no portal da entrada,
u pariu sem tardada
Jesu-Crist’, e foy-o deitar,
como molher menguada,
u deitam na cevada,
no preseve apousentar
entre bestias d’arada.
E non ar quero obridar
com’ angeos cantada
loor a Deus foron cantar
e «paz em terra dada»;
nem como a contrada
aos tres Reis em Ultramar
ouv’ a ‘strela mostrada,
por que sem demorada
vinheron sa oferta dar
estranha e preçada.
Outra razón quero contar
que lh’ ouve pois contada
a Madalena: com’ estar
viu a pedr’ entornada
do sepulcr’ e guardada
do angeo, que lhe falar
foi, e disse: «Coitada
molher, sei confortada,
ca Jesu, que véns buscar,
resurgiu madurgada».
E ar quero-vos demostrar
gran lediç’ aficada
que ouv’ ela, u viu alçar
a nuvem lumenada
seu Filh’; e pois alçada
foi, viron angeos andar
entr’ a gent’ assũada,
muy desaconselhada,
dizend’: «Assi verrá julgar,
est’ é cousa provada».
Nem quero de dizer leixar
de como foi chegada
a graça que Deus enviar
lhe quis, atan granada,
que por él esforçada
foi, a companha que juntar
fez Deus, e ensinada,
d’Espirit’ abondada,
por que souberon pregar
logo sem alongada.
E, par Deus, non é de calar
como foi corõada,
quando seu Filho a levar
quis, des que foi passada
deste mund’ e juntada
com él no ceo, par a par,
e Reyna chamada,
Filha, Madr’ e Criada;
e porém nos dev’ ajudar,
ca x’é noss’ avogada.
Alfonso X el Sabio